sábado, 6 de outubro de 2012

Johannes Vermeer, um dos meus pintores favoritos /Luciano Cortopassi


Johannes Vermeer
(1632-1675), Delft – Holanda.

A nova ordem que se instaurou nos Países Baixos a partir da trégua, firmada em 1609, trouxe diferenças culturais importantes entre o sul, sob domínio da corte católica espanhola, e as províncias do norte, protestantes. A inexistência da devoção a imagens nos cultos protestantes desvinculou a Arte da Igreja. Ainda, a ausência nas Províncias Unidas de uma cultura palaciana propiciou o desenvolvimento de uma arte mais singela e de temáticas do cotidiano da classe média , diferente da monumentalidade e dos temas eruditos (históricos e mitológicos) da arte do sul.

No norte, o desenvolvimento de um forte comércio interno e internacional e da indústria artesanal enriqueceu a classe média, em especial os comerciantes e industriais. Essa burguesia rica concentrava o poder político e econômico determinava o gosto por temáticas artísticas do cotidiano (como pintura de gênero e natureza morta) - enquanto no sul a cultura cortesã espanhola sufocou em parte a expansão de uma cultura burguesa.

A opulenta classe média holandesa encomendava quadros para decorar suas casas e o tamanho das pinturas teve que ser adequado à escala dessas habitações - as grandes dimensões, comuns em quadros da corte, ficaram destinadas apenas aos prédios públicos. Os temas relacionados a vida cotidiana perduraram e, no Barroco holandês, intensificou o olhar intensivo e subjetivo sobre aquilo que nos parece banal, chegando ao conceito de Realismo.

Nesse ambiente nasceu Vermeer, um dos pintores mais proeminentes desse contexto. Atribui-se a sua autoria menos de 35 pinturas, que não puderam ser datadas com segurança até hoje. Essa escassa produção deve-se à meticulosidade e lentidão com que pintava seus quadros que, apesar de bem valorizados, foram insuficientes para quitar suas dívidas e garantir o sustento de seus 15 filhos - mesmo sendo que ele desenvolvia as atividades de comerciante e avaliador de obras de arte paralelamente ao trabalho de ateliêr.

Ele viveu em Delf, e a representação da vida doméstica era o tema básico da escola de Delft. Diferente das obras barrocas de Rembrandt, cujos aspectos subjetivos tendem ao místico e estão vinculados ao tratamento dado à iluminação mais contrastante, as imagens criadas por Vermeer costumam apresentar um momento íntimo de uma ou duas figuras no interior de suas habitações em um momento iluminado do dia, como vemos em A leiteira. A sua técnica era de extremo naturalismo nas representações das texturas e do brilho de materiais preciosos, e seus quadros são concebidos numa tonalidade clara e num cromatismo intenso e harmônico, como vemos em Mulher sentada ao virginal. O resultado desse domínio artístico e intelectual na elaboração de seus quadros é a simplicidade surpreendente na percepção do conjunto. Em A tocadora de viola, por exemplo, o olhar aproximado e instantâneo da cena deixa evidente a concepção da obra como representação de um fragmento fugaz da realidade cotidiana de seus personagens. O que há de mais singelo em nosso cotidiano, aos olhos de Vermeer, transforma-se em algo de forte carga espiritual, tanto em suas pinturas de gênero como em suas poucas obras de paisagem, como a Vista de Delft.

O reconhecimento da qualidade artística da obra de Vermeer por historiadores só ocorreu na década de 1860, quase dois séculos após a sua morte





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